terça-feira, 11 de junho de 2013

Until the Very End

Eu era um menino anormal tentando ser normal, sabe? Sempre tive tudo que eu quis – talvez por ser filho único, talvez porque meus pais gostavam de serem os pais que os pais deles não puderam ser. 

Um dia – 2003 pra ser mais preciso - meu pai chegou em casa todo molhado com um livro em uma sacola. Na capa, havia um menino montado em uma vassoura. Ele queria que eu lesse, “ sua prima mais velha leu e adorou!” dizia ele. Eu disse que o livro era muito grande, e então, ele me propôs o seguinte desafio: Se eu o lesse, e me dispusesse a conversar sobre o livro depois , ele me daria o robô que eu tanto estava importunando-o para comprar pra mim.

No mesmo momento aceitei o desafio e comecei a lê-lo. Lembro que nada fazia muito sentido. Coisas malucas aconteciam com o menino que ninguém podia explicar. E eu continuei, não mais pela obrigação, mas pra saber o que acontecia, qual era a causa, o porquê. Até que eu descobri, no célebre momento aonde Hagrid conta à Harry que ele é um Bruxo.

Li o livro e ganhei o robô, mas a partir do momento que eu soube que havia continuações do livro, clamei ao meu pai que os comprasse. – Pobre Carlos, mal sabia ele que naquele momento, havia criado um monstro devorador de livros.

No decorrer das semanas e meses, eu já sabia sobre câmaras secretas, duelos, Basiliscos, casais que deviam ou não ficar juntos, sobre Sírius, sobre os Elfos, os marotos, os centauros e estava tão imerso naquele mundo que nada me fazia querer sair de lá. Eu os reli várias vezes e aguardei e vi cada um dos filmes. E cada leitura, com o passar do tempo, me proporcionava uma nova perspectiva: sobre preconceito, sobre aceitação, sobre classes e sobre os próprios personagens. Conceitos complexos para apenas um garoto de 10, 12 anos. Eu sei. Mas eu falei que não era normal, lembra?

Harry esteve comigo quando minha mãe descobriu o câncer enquanto estava grávida da minha irmã. Eu compartilhei da revolta que ele sentia na Ordem da Fênix. Eu de certa forma o entendia, afinal, eu tive que me tornar um adulto, assumir responsabilidades, e Harry Potter era uma das poucas coisas que me faziam voltar a ser um pré-adolescente, mesmo que temporariamente. Minha irmã nasceu minha mãe teve outro câncer e veio a falecer, e em todos os momentos, Harry esteve comigo. E de alguma forma tudo mudou: Eu mudei ali. Meu comportamento mudou, minha percepção se abriu para todas as coisas que eu tentava esquecer e ser só...normal. Mas eu não era normal, e nunca seria. Era hora de parar de keep up with the Dursleys. 

Quando minha mãe morreu, eu escrevi uma fanfic. Então eu descobri que gostava de escrever. Continuei, mas demorei meses para mostrar meus textos a alguém. A pessoa que eu mostrei, por um acaso, era minha prima, que é uma Ficwritter. Ela disse que eu tinha jeito pra coisa. E me apresentou um fórum aonde pessoas se reuniam para escrever sobre Harry Potter e algumas outras poucas séries. Eu conheci novas pessoas, fiz novos amigos, que sabiam exatamente quem eu era. Que não tinham julgamentos prévios. Que me aceitavam e passaram a me amar sem qualquer rótulo.

Eu conheci a mulher que me deu todo um novo sentido a palavra “querer”. Eu descobri em alguém próximo olhos que sempre me apoiariam e sempre estariam lá por mim. Eu admiti minha natureza dupla. Quem eu era, quem eu sempre fui e quem eu sou. 

Harry Potter apareceu para mim como um desafio. Um desafio que aceitei e que deu início as minhas duas paixões: Ler e escrever. Ajudou a formar meus valores e indiretamente a minha forma de ler o mundo. Ajudou-me a fazer amizades que realmente importam, com pessoas que realmente me entendem e me amam do jeito que eu sou; Sem ter de me adequar a qualquer norma para ser aceito. Harry esteve comigo até o fim, assim como eu fui até o fim com ele. Until the very end.